03 novembro 2009

Inveja e Ciúme

INVEJA E CIUMES:
Sirlene de Oliveira Souza
Psicanalista Integrativa, Terapeuta TVP e MPT, e
Numeroterapeuta.
Tem-se a tendência de confundir inveja com ciúmes.
A linguagem cotidiana parece evitar o conceito de inveja, e tender a substituí-lo pelo de ciúmes.
O ciúme baseia-se em uma relação de amor e visa ter o objeto amado e à remoção do rival. O ciúme é o sentimento de “cuidar” do objeto amado, protegê-lo.
A inveja é a relação em que o sujeito deseja alguma posse ou qualidade do objeto desejado – fundir-se a ele ou destruí-lo.
A inveja que o homem tem da potência ou das posses de outro, a inveja que as mulheres têm uma das outras, por exemplo. O desejo de ter, e, achar-se impotente para conseguir alcançar o que se observa no Outro.
Podemos perceber como de forma dissimulada, os invejosos se apresentam diante das situações corriqueiras da vida cotidiana. Na sua maioria são pessoas com as “melhores intenções”, agindo para o “bem” dos outros, pontuando situações, só percebidas por eles, uma visão que somente “pode acrescentar” na amizade ou no relacionamento.
São fofoqueiros de plantão, “pré-ocupados” com o “bem estar” dos outros. Têm de ser “honestos”. Sentem-se incomodados com a felicidade ou com a paz de espírito de seus “amigos”.
A própria fonte de desejo é tornada má, e, portanto, tem de ser destruída ou tornada obscura, ridicularizada ou até mesmo anulada, jamais poderá ser considerada boa por não poder ser alcançada. É esse aspecto danificador da inveja, que é tão destrutivo.
A inveja, embora surgindo a partir do desejo de ser igual, ou obter o que está na posse do outro, é impregnada de instinto de destruição e morte.
A media que cresce a ansiedade, o sentimento de culpa torna-se aumentado, e a necessidade de destruir essa figura de “desafeto” acaba por tornar-se prioridade, assim em fantasia ataca, pelo olhar (mau-olhado), pelo “descaso”, ou discursos de desaprovação ou julgamento, para poder salvar-se de sua própria inveja.
São os penosos sentimentos de inveja, que acarretam o desejo de danificar as qualidades dessa figura que lhe pode dar esses sentimentos penosos de impossibilidade ou impotência.
Fundindo-se a inveja e a voracidade, o desejo é conduzido à destruição dessa figura representativa da própria impossibilidade de ser, de modo a que não reste mais nada a ser invejado. – “O que os olhos não vêm o coração não sente!”.
Ao tentar satisfazer a inveja o ser é torturado por solidão, remorso, culpa e perseguição; a infelicidade cresce. Torna-se um processo obsessivo e compulsivo, onde nada mais se percebe além daquilo que se tenta destruir, na intenção de incorporar energia de apresso e gratidão. A fantasia de ter sido muito “bom”, e por isso mesmo, deverá ser reconhecido pelos outros, naquilo em que não consegue se reconhecer. Torna-se submisso e ao mesmo tempo em que a arrogância – leia-se insegurança, torna-se figura de destaque.
Em um desenvolvimento normal, a inveja se torna mais integrada. A gratificação experimentada estimula a admiração, o amor e a gratidão, ao mesmo tempo em que é inveja.
A inveja consciente de que se pode ser tão bom, ou melhor, que alguém ou alguma coisa, a inveja que se utiliza das qualidades do Outro como exemplo a ser seguido ou como um sinalizador em seu próprio desenvolvimento pessoal, e que, portanto, gera gratidão por encurtar o caminho de aprendizado. “Quero ser igual a... vou conseguir isso também”.
Somente a gratidão supera e modifica a inveja.
Assim num círculo benevolente, a inveja diminui à medida que aumenta a gratidão; a diminuição da inveja permite maior gratidão, que por sua vez, incrementa a diminuição da inveja.
O sentimento de inveja, embora enfraquecido, sempre permanece. Essa inveja que permanece, quando não mais sentida como destrutividade devastadora, não mais dará origem a sentimentos avassaladores de culpa, ansiedade, medo e perseguição.
Conforto não é sinônimo de harmonia, assim como prazer não é sinônimo de felicidade. Sem desconfortos e desprazeres estaríamos fortemente condicionados à estagnação. A inveja, o sentimento de superar o outro é a grade alavanca de desenvolvimento e aprimoramento do ser humano. Mas, a inveja, sem gratidão, torna-se geradora de destruição e estagnação.
Vida é desafio, é mudança, é conquista e, sobretudo, é um diálogo franco e direto com a realidade.

23 maio 2009

DESCONFIANÇA de tempo suspeito- (1ª parte)

Tempo do prazer é um tempo suspeito. Essa desconfiança está em relação com o corpo e o tempo finito do corpo que morre. O corpo desmente a maior desconfiança, ele decai. Há uma revolta e um massacre do corpo. Ele é finito.
Falta tempo.
Vivencia-se pouco o corpo, apesar de visualizá-lo em out-doors. Culto ao corpo. O envelhecimento do corpo, hoje, com mais tempo do corpo em vida, não sabe muito bem o que fazer; não se tem conhecimento de como é viver muito, viver longamente. Criam-se atividades para dar sentido ao corpo.
O tempo de lazer (nos finais de semana) não é articulado, mas um processo compensatório.
A modernidade – intenção imediata; diminui as distâncias com os acontecimentos. São muitos os contatos em menor tempo. O acesso é diferente do direito (esforço em relação à conquista), a falta do deslocamento físico para ter acesso, não se traduz em direito.
Olhar a si mesmo, e olhar o outro demanda tempo; refletir, pensar, sentir. Caminho da desaceleração. Na aceleração de movimentos, escravos da velocidade, escravos do sentimento de dever. Articular o tempo entre obrigação (dever) e prazer (liberdade). No dever há obrigação de fazer em menor tempo, e o corpo treinado, para ser produtivo, um instrumento prático. O corpo “coisificado”. O corpo automatizado ao tempo - o corpo subordinado ao trabalho; cadeirante passa a maior parte do tempo sentado; repete movimentos.
O corpo não é o corpo real, é idealizado, ilusionado ideal. Conquista-se o direito de manipular a idade. Não é permitido envelhecer, mas as várias articulações para a permanência no jovem. Adquire-se o direito sobre a massa corpórea, regiões determinadas do corpo passam a ser cuidadas porque serão vistas – imagem. Valorizar o visual é o realce na sociedade do olhar, o culto ao corpo como forma de “reforço” da auto-estima.
A fase infantil tende a ser superada – não há tempo para privilegiar a infância, não há tempo para que a infância seja vivenciada como tal. O mercado, a sociedade do olhar oferece: top-model, miss isso, miss aquilo, fundamentada no prazer.
Durante toda a vida existe um projeto para o corpo. Desde o nascimento se recebe instruções externas, a pessoa não sabe bem o que fazer, no contexto geral. Fica a espera do recebimento de instruções. O corpo no fazer, perde-se do ser. O sentido emocional distancia-se, perde-se o determinismo.
Pensar na vida como processo é o tempo como possibilidade; em determinado momento perceber a vida como possibilidades futuras de viver um novo tempo diferente.